sábado, 28 de novembro de 2015


SILÊNCIO E MARGINALIDADE NA POESIA DE GRAÇA PIRES

                                                Victor Oliveira Mateus

O novo livro de Graça Pires, Uma claridade que cega, afirma-se fundamentalmente como uma procura: “eu procuro de novo/ o princípio de tudo,” (p.10); “na marginalidade do sossego/ reacendo o lume…” (p.12); “escuto até à exaustão/ os rumores de um tempo mais remoto” (p.14). Vemos, portanto, que são específicas desta aventura poética três instâncias fundamentais: o sossego – muitas vezes aparecendo sob outras formas, como por exemplo a do silêncio -; a marginalidade, entendida esta não como uma vivência ostensivamente burguesa e urbana, mas tão-só como a rejeição de uma norma que impede a busca dessa claridade absoluta, fundamento do Ser e da escuta poética: “sou da estirpe dos aventureiros, dos caminhantes, dos fugitivos.” (p.30); “fujo na crina de um potro livre,/ sem jugo, em veloz cavalgada.” (p.40) e, finalmente, o alvo desta mesma procura metamorfoseado este na imagem da “fonte mais remota,/ onde a água tem o sabor/ do leite materno” (p.60). Esta associação sossego/silêncio, procura pela margem e propensão para a fonte originária ou, como neste livro se apresenta, para essa claridade que cega , tem sido uma constante na poética de Graça Pires: “nómada na noite, entro no coração do texto,/ para dizer o exílio nos olhos de Ulisses.” (in Uma certa forma de errância, 2003, p.43); “Um saber de dialectos nocturnos,/ permite-me riscar nos pulsos um silêncio de fuga.” (op. cit. p.51); “seguimos pela noite indiferentes/ a todos os ruídos que rebentam/ o rigor do silêncio.” (in Uma vara de medir o sol, 2012, p.69).
Vemos também que esta procura é não só uma inquirição em torno do princípio originário, dessa claridade primeira, como também um trabalho em torno da palavra para que dela seja removida toda a ganga do ruído e da inautenticidade:

“NOME:-
Interpelamos as palavras à procura de um nome para a casa
onde moramos. Um nome que se ajuste inteiro à memória
do olhar e do silêncio. Um nome tão secreto como as canti-
gas que as mães cantam baixinho enquanto embalam nos
braços os filhos e a noite para não perderem o poder de
repartir a sede.”

(in Caderno de Significados, 2013, p.21)

E a este almejar de uma claridade que cega, ou seja, desta beleza terrível, não é alheia a poesia de Rilke logo anunciada no quarto poema deste livro. Vejamos o que diz o poeta alemão:

“(…). Pois o belo apenas é
o começo do terrível, que só a custo o podemos suportar,
e se tanto o admiramos é porque ele, impassível, desdenha
destruir-nos. Todo o Anjo é terrível.”

(“A Primeira Elegia” in As Elegias de Duíno, Assirio & Alvim, 2002, p.39)


“Todo o Anjo é terrível. No entanto, ai de mim!
Pelo canto vos invoco, aves da alma quase mortais,
por saber o que sois. Para onde foram os dias de Tobias,
quando um de entre os mais luminosos apareceu, no simples limiar da entrada
(…)
Porém nós, ao sentir, desvanecemo-nos. Ai de nós,
ao respirar nos extinguimos; de brasido em brasido
vamos perdendo o nosso aroma. (…)”

(“A Segunda Elegia” in As Elegias de Duíno, Assírio & Alvim, 2002, p.47)

Esta antinomia Anjo/terribilidade, claridade/fulminação do olhar  na autora, alarga-a Graça Pires à presença de outros autores nomeadamente de Virgínia Woolf de quem a poeta diz, em dois versos que validam esta minha linha de leitura: “ As múltiplas faces da vida e da morte/ em diálogo secreto.” ( In Uma claridade que cega, 2015, p 35). Há ainda uma outra convergência com a romancista inglesa: em Mrs Dalloway , Clarissa Dalloway interroga-se frequentemente sobre o seu passado, o seu presente e o futuro, ora estas dimensões da temporalidade trespassam todo o livro de Graça Pires, aliás, este jogar no tempo é frequente em Virgínia woolf, veja-se, por exemplo, outro romance seu: Orlando , que, baseado na vida de Vita Sackville-West, narra a história de um jovem que certo dia acorda mulher e dotado de imortalidade, Orlando acompanha mais de três séculos da vida dessa personagem. Vemos, por conseguinte, que Clarissa Dalloway ( o livro narra apenas um dia da sua vida) vive entre a felicidade e a ideia de suicídio, Orlando entre a imortalidade e o efêmero rotineiro, ou seja, ambos desenham a sua errância entre um polo positivo e outro negativo, tal como este livro de Graça Pires entre a claridade e a cegueira. Não é despiciendo enfatizar  também aqui a riqueza imagística das autoras: a de Virgínia Woolf deu azo a riquíssimas obras de arte, como por exemplo o romance As Horas de Michael Cunningham, que, por sua vez originou o filme homónimo (2002) de Stephen Daldry com as soberbas interpretações de Maryl Streep, Nicole Kidman e Julianne Moore e ainda a película Orlando (1992) de Sally Potter com o andrógino desempenho de Tilda Swinton. Já as imagens da poesia de Graça Pires, com a sua sobrevalorização do telúrico e/ou do aquífero, bem como o chamar à liça do afetivo e do emocional, entroncando, portanto, em Pascoaes, Torga, Sophia,  Nuno Júdice e algum Ruy Belo, mas  recusando as escritas mais debruçadas sobre as vivências citadinas, corre o risco de – com as suas águas, as suas gaivotas, as suas estevas, a sua urze, etc. - , numa leitura apressada, serem remetidas para um filo passadista, todavia, uma leitura cuidada desta escrita verificará que o que existe é todo um paradigma de referentes ao serviço de intentos outros – exemplo: falar-se do envelhecimento em Outono: Lugar Frágil  (1994), dessa Odisseia que é o estar-aqui em Uma certa forma de errância ( 2003), da falsa oposição que existe entre o trabalho braçal e doméstico relativamente ao aperfeiçoamento moral e religioso em não sabia que a noite podia incendiar-se nos meus olhos (2007), etc. Um terceiro, e último, diálogo que Graça Pires mantém é com Pablo Neruda: “Hoje, que não escuto o mar/ fujo na crina de um potro livre,/ sem jugo, em veloz cavalgada. Tenho nos olhos um incêndio tangível(…)/ Doeu-me a voz quando bradei,/ sem fôlego, o verso de neruda:/ quero inventar o mar de cada dia.” , a abordagem da realidade material,  do sócio-económico, na poesia de Graça Pires é sempre feita de forma subtil, mas, paradoxalmente, forte: “Há por todo o lado palcos improvisados/ onde, em bocas distorcidas, se anunciam/ perigos e presságios, ameaças e avisos./ Este é um país de sombras tão baldias que magoa. “ (p28): “ Cravo as unhas na carne da indiferença./ Escrevo sangue/ com o lápis gasto pela culpa acorrentada/ à cegueira que desfoca os olhares/(…)/ Leio dor. Dolorosamente./ Em lugares desabrigados,/ em portas franqueadas aos rasgões/ da vida rondada pela morte.” (p 33), não estamos – nestes versos – longe de tantos poemas de Nazim Hikmet ou do Canto Geral de Neruda, onde podemos ler: “Mas tu não sofreste? Não, eu não sofri. Eu sofro/ apenas os sofrimentos do meu povo. Eu vivo/ dentro, no interior da minha pátria, célula/ do seu infinito e abrasado sangue. “ ( In Canto Geral, Campo das Letras, 1998, p 480, tradução de Albano Martins).
 O presente livro de Graça Pires ousa ainda três áreas estreitamente conectadas com tudo aquilo de que tenho vindo a falar: o plano do existencial e do dia-a-dia, o da inquirição da palavra e da poesia e, finalmente, um plano metafísico onde a esperança e o sonho teem um papel fundamental. Acerca desse primeiro plano leia-se o poema da página 39 da presente obra:

Só folheio os jornais de vez em quando.
Quase tudo o que se escreve
são golpes confusos
que abrem nas entranhas a impressão
de um mundo por entender.
A verdade chega-nos apenas
através do silêncio dos que sonharam
um tempo sem estas ruínas
que descarnam e sepultam
a mais valiosa esperança.

Este poema ilustra na perfeição o que temos vindo a dizer: primeiro, estabelece a distinção entre aparências (golpes confusos, mundo por entender) e a busca da verdade, isto é, da claridade que cega ; segundo, reafirma a importância do silêncio e do sonho para bem entender e agir, convém, no entanto, acrescentar que o sonho nunca é, na poesia de Graça Pires, sinónimo de devaneio ou alienação, ele surge sempre ou como capacidade da memória ao serviço da rememoração e do conhecer ou – como aqui – como rasgo da imaginação que alimenta a praxis ; terceiro, a recusa da poeta em integrar o coro das ruínas , em integrar o número daqueles que descarnam a esperança e a ousadia, daí o já referido colocar-se à margem da voracidade da turbamulta, daí também o termo marginalidade que usei no título deste texto ; quarto e último, a distinção acenada no sexto verso: a Graça Pires não interessam as certezas  tão operativas e eficazes nas ciências e tão úteis nos registos de tipo jornalístico, à autora importa a verdade , dito de outro modo: os seus olhares antropológico e histórico aparecem sempre alicerçados numa visão ética, assim como o sociológico se curva ante o metafísico, numa frontal recusa do injusto e do mal, entendido este no seu sentido radical: “Este mal é radical, a partir do momento em que corrompe o fundamento de todas as máximas (morais).” (Kant, In A Religião dentro dos Limites da Simples Razão , Ak.Ausg., VI). Por tudo isto, competirá à Palavra, ou melhor, à Poesia, conduzir-nos neste caminho iluminante, competirá a ela assumir-se plenamente como Uma claridade que cega. 

O verbo: clareira em cama de fenos
ou ilha oculta de ocultos silêncios.
Como se o nervo do vento
fustigasse a voz dos poetas
esmagando a rigidez dos sons.
Apta a declinar as regras do jogo
retenho, nas arestas da página,
o som do lápis, como um pião
rodopiando traços inseguros.
A película de imagens no interior do texto,
levemente aberto ao segredo das mãos
deixa que me habite um desvario
que faça regressar um verso invisível.


    ( In Uma claridade que cega, p 43)


 Livraria Ferin - Lisboa, 28 de novembro de 2015.
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sexta-feira, 20 de novembro de 2015


                   ACTE  III, SCÈNE II

(...)


MARA: Il faut bien se tourner vers Dieu quand le reste n'est plus là.

VIOLAINE: Lui du moin ne manquera pas,

MARA, doucement : Peut-être, qui le sait, Violaine, dis?

VIOLAINE: La vie manque et non point la mort où je suis.

MARA: Hérétique! est-tu sûre de ton salut?

VIOLAINE: Je le suis de sa bonté, qui a pourvu.

MARA: Nous en voyons les arrhes.

VIOLAINE: J'ai foi en Dieu qui ma fait sa part.

MARA:  Que sais-tu de Lui qui est invisible et que rien ne manifeste?

VIOLAINE: Il ne l'est pas devenu plus pour moi que n'est le reste.

MARA, ironiquement : Il est avec toi, petite colombe, et Il t'aime?

VIOLAINE : Comme avec tous les misérables, Lui-même.

MARA: Certes son amour est grand!

VIOLAINE: Comme celui du feu pour le bois quand il prend.


    Claudel, Paul. L'annonce faite à Marie. Paris: Éditions Gallimard, 2002, pp 159 - 160.
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Paul Claudel (6/8/1868 - 23/2/1955) poeta e dramaturgo francês é, ainda hoje, uma figura controversa do mundo das letras. O seu catolicismo acirrado, as suas posições vincadamente de direita: Claudel chegou a dedicar um poema - em 1940 - ao Marechal Pétain (Paroles au Maréchal) logo a seguir à derrota da França frente à Alemanha e, em 1913, tinha já sido o responsável pelo internamento num hospital psiquiátrico da sua irmã mais velha, a escultora Camille Claudel, que ali permaneceu 30 anos e que, durante todo esse tempo, o escritor visitou apenas sete vezes. No entanto, apesar do seu exacerbado conservadorismo, não consta que Paul Claudel tenha simpatizado com as ideias fascistas da época, aliás, simpatizou sim, e bastante, com De Gaulle a quem dedicou também um poema. Em L'annonce faite à Marie , Paul Claudel desenvolve uma fascinante e bem tecida intriga em torno de temas caros ao seu catolicismo: o mal, a santidade, a busca da perfeição, o milagre, a dádiva de si ao outro, etc.
Sobre estes temas poderá ver os filmes: A Paixão de Camille Claudel de Bruno Nuytten, com Isabelle Adjani e Gérard Depardieu e também A anunciação feita a Maria de Alan Cuny, filme premiado no Festival de Berlim de 1992.
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segunda-feira, 16 de novembro de 2015

         ACTE II, SCÈNE III

JACQUES HURY: O ma  fiancée à travers les branches en fleurs, salut!       

     Violaine est au-dehors, invisible.

Violaine, que vous êtes belle!

VIOLAINE: Jacques! Bonjour, Jacques!
Ah! que vous êtes resté longtemps là-bas!

JACQUES HURY: Il me fallait tout dégager et vendre, me rendre entièrement libre
Afin d'être l'homme de Monsanvierge seul
Et le vôtre.
- Quel est ce costume merveilleux?

VIOLAINE: Je l'ai mis pour vous. Je vous en avais parlé.
Ne le reconnaissez-vous pas?
C'est le costume des moniales de Monsanvierge, à peu près, moins le manipule seul, le costume qu'elles portent au choeur. (...) Et que les femmes de Combernon ont le droit de revêtir deux fois:
Premièrement le jour de leurs fiançailles.

     Elle entre.

Secondement de leur mort.

JACQUES HURY: Il est donc vrai, c'est le jour de nos fiançailles, Violaine? (...) Que vous êtes belle, Violaine! Et que ce monde est beau où vous êtes.
Cette part qui m'avait été réservée!

VIOLAINE: C'est vous, Jacques, qui êtes ce qu'il y a de meilleur au monde.
(...)
JACQUES HURY: Et quant à moi, Violaine...

VIOLAINE: Ne dites rien. Je ne vous demande rien. Vous ètes là et cela me suffit.
Bonjour, Jacques!
Ah, que cette heure est belle et je n'en demande point d'autre.


   Claudel, Paul. L'annonce faite à Marie. Paris: Éditions Gallimard, 2002, pp 97 - 100.
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sábado, 14 de novembro de 2015

A apresentação pública do livro Efeitos de Captura de Luís Filipe Sarmento realizou-se, no dia 3 de outubro de 2015, no Café Império em Lisboa e a ela assistiram cerca de duas centenas de pessoas. Falaram acerca da obra - e do autor -, da esquerda para a direita: Virgínia do Carmo, José Pinto Bandeira, Victor Oliveira Mateus, Maria João Cantinho, Luís Filipe Sarmento, Casimiro de Brito e Mário Contumélias (Foto gentilmente cedida pelo fotógrafo Vasco Ribeiro).
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quarta-feira, 11 de novembro de 2015


Foto da representação - com assinalável sucesso - da peça Don Carlos de Schiller no Blue Elephant Theatre de Londres em 2011 (observe-se, em cima da mesa, o mapa de Espanha).


         CENA FINAL

(...)
ISABEL

Não façais caso das minhas lágrimas:
queria tanto não chorar neste momento,
mas não consigo, é mais forte que eu.
Mas quero dizer-vos isto: admiro-vos.

CARLOS

Fostes vós a confidente daquela amizade,
entre ele e mim: foi por meio dele
que pude aproximar-me de vós em Aranjuez;
foi por meio dele que agora estamos
de novo juntos, sós. Ele morreu;
eu venho aqui correndo perigo de vida.
Sereis sempre para mim a única mulher...

(entram, silenciosos, Rei, Inquisidor, Alba, Lerma, Domingo. Rei, Alba e Lerma de espadas empunhadas. Carlos e Isabel não se apercebem da presença dos intrusos)

Fujo agora de Espanha. Nunca mais verei
o meu pai. Odeio-o. Tudo o que por ele
eu sentia morreu. Perdeu o único filho.
Parto, então, para salvar o mundo
de tiranos como ele. Adeus!

(Carlos e Isabel beijam-se)

ISABEL

Carlos... que será de mim nesta Corte?
Eu que não posso aspirar a um heroísmo
como o teu e o de Rodrigo?
Mas volto a dizer: admiro-te.

(...)
( avançam rápidos Rei e fidalgos, de espadas apontadas para Carlos)

FILIPE (voz terrível)

É o último engano da tua vida!
(...)
Senhor Cardeal Inquisidor!
O meu dever está cumprido!
Cumpri agora o vosso.  

  
  Schiller, Friedrich. Don Carlos. Lisboa: Edições Cotovia, 2008, pp 166 - 168 (recriação poética de Frederico Lourenço).
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terça-feira, 10 de novembro de 2015





O Don Carlo de Verdi: Don Carlos (Kaufmann) e Rodrigo, Marquês de Posa (Hvorostovsky). Uma das árias mais libertárias desta ópera e que segue muito de perto a peça de Schiller.

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       ACTO 3, CENA 6

(...)
RODRIGO

O que recebestes de Deus, meu Senhor, todo este vasto império:
terdes recebido a custódia dos homens faz de vós
rei e imperador, mas perante Deus sois, como nós, um homem.
Também vós sofreis como homem mortal, também amais
e desejais! Mas com quem partilhareis a vossa humanidade?
Se rebaixais os outros homens a instrumentos da vossa vontade,
como fruíreis (homem que sois!) daquela harmonia
- tão humana porque divina! - que soa apenas
quando todos se juntam no desejo de sentirem
como se em vez de muitos fossem um só?

FILIPE (para si)

Meu Deus, ele toca-me a alma...

RODRIGO

Senhor, cheguei há pouco da Flandres e de Brabante,
Províncias florescentes do vosso império!
Grande e honroso povo - povo cheio de valor
e de bondade, povo que em vós põe os olhos
como num pai. Pensei em vós, na missão divina
que vos é outorgada pelo governo de um tal povo.
Mas depois olhei à minha volta: vi cadáveres,
homens e mulheres queimados em autos-de-fé;
vi enforcamentos na praça pública, sangue, morte, destruição.
Onde podia haver paz, há só ódio, conflito, tumulto.

FILIPE (defensivo)

Olhai, no entanto, para a Espanha, Marquês.
Aqui floresce a paz como nunca outrora
no passado. É a mesma paz que quero para a Flandres.

RODRIGO (exaltado)

Paz? Chamais a isso paz? A paz de um cemitério!

(...)

FELIPE (calmo)
(...)
por isso vos digo, pela estima que fizestes nascer em mim:
acautelai-vos e tende prudência,
para que vos não vejais enredado
nas malhas da Santa Inquisição.


   Schiller, Friedrich. Don Carlos. Lisboa: Edições Cotovia, 2008, 121 - 124. (recriação poética de Frederico Lourenço).
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Friedrich Schller (10/11/1795 - 9/5/1805) foi, juntamente com Goethe e com Herder, uma figura maior do Romantismo Alemão e do Classicismo de Weimar. Da sua obra, literária e filosófica, ressalta a peça de teatro Don Carlos. Este texto, cuja ação decorre no século XVI desenvolve-se segundo duas linhas de força: primeiro, o mau relacionamento de Don Carlos ( 1545-1568) com o pai, Filipe II de Espanha (21/5/1527 - 13/9/1598), motivado sobretudo pelo autoritarismo do rei e pela forte repressão que exercia sobre a Flandres, mas também pelo facto de Filipe ter casado com Isabel de Valois, princesa francesa que inicialmente rumara a Espanha para casar com o Infante; segundo,  a forte oposição entre os ideais progressistas de Carlos, e do seu amigo maior - Rodrigo, Marquês de Posa -, e a repressão exercida pelo poder real poderosamente apoiado pela Inquisição. A partir daqui cresce uma enorme tecedura de paixões, ódios e traições, que culminam na morte de Carlos e de Rodrigo. Aliás, os historiadores ainda hoje não se entendem quanto à morte do Infante, que, para uns - devido ao seu temperamento fortemente emotivo e instável - se teria suicidado na prisão, mas para outros estar-se-ia perante um assassinato político. A peça inclina-se para a segunda opção, vejam-se as páginas 156-163.da edição aqui usada.
Acrescente-se ainda o soberbo uso que desta peça faz Verdi na ópera com o mesmo nome. As óperas de Verdi, numa Itália fortemente ocupada pela Áustria, teem todas um enorme cunho político, de rejeição de tudo o que é opressão e autoritarismo, assim, a sua Don Carlos, não foge à regra, veja-se, por exemplo, a ária em que Filipe II fala com Rodrigo e a nítida inflexão da música quando Rodrigo diz que o rei constituiu, sim, um reino de paz, mas que essa paz é a paz dos sepulcros. Sugere-se (até) uma análise comparativa das duas obras: a peça de Schiller e a ópera de Verdi.
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domingo, 8 de novembro de 2015


Não deve ser fácil para um ator interpretar um papel, sobretudo se esse papel for de uma obra clássica, sabendo que tem atrás do seu desempenho toda uma plêiade de representações impolutas e de referência. Mesmo assim alguns decidem ousar! Joseph Fiennes (na foto com James D'Arcy fazendo de Gavestone) avança - em 2001 no Crucible Theatre Sheffield - com a sua interpretação de Eduardo II, mesmo sabendo que tinha de "terçar armas" com interpretações paradigmáticas como as de Derek Jacobi, Ian McKellen (1970) e a de Steven Waddington (1991) no filme homónimo de Derek Jarman. Pelos vistos não se saiu mal, pois o crítico do The Guardian escreve, em 15 de março de 2001, e depois de atribuir quatro estrelas ao espetáculo: " Finne's true gift is for inwardness, and, through his graceful stealth, he elevates Marlowe's rhetorical homily into true tragedy."
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                     ACT TWO, SCENE TWO
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(...)
QUEEN ISABELLA: Sweet husband, be content; they all love you.
KING EDWARD: They love me not that hate my Gaveston.
I am that cedar; shake me not too much;
And you the eagles, soar ye ne'er so high,
I have the jesses that will pull you down;
And AEque tandem shall that canker cry
Unto the proudest peer of Britainy.
Thou that compar'st him to a flying-fish,
And threaten'st death whether he rise or fall,
'Tis not the hugest monster of the sea,
Nor foulest harpy, that swallow him,
YOUNGER MORTIMER: If in his absence thus he
favours him,
LANCASTER: That shall we see: look, where his lordship comes!
    ( Enter Gaveston )
KING EDWARD: My Gaveston!
Welcome to Tynemouth! Welcome to thy friend!
Thy absence made me droop and pine away,
For, as the lovers of fair Danae,
When she was lock'd up in a brazen tower,
(...)
GAVESTON: Sweet lord and king, your speech
preventeth mine;
Yet have I words left to express my joy,
The shepherd, nipt with biting winter's rage,
Frolics not more to see the painted spring
Than I do to behold your majesty.
KING EDWARD: Will none of you salute my Gaveston?
LANCASTER: Salute him! Yes, Welcome, Lord Chamberlain!
YOUNGER MORTIMER: Welcome is the good Earl of Cornwall!
WARWICK: Welcome, Lord Governor of the Isle of Man!
PEMBROKE: Welcome, Master Secretary!
KENT: Brother, do you hear them?
KING EDWARD: Still will these earls and barons use me thus?
GAVESTON. My lord, I cannot brook these injuries.
QUEEN ISABELLA (aside) : Ay me, poor soul, when these begin to jar!


     Marlowe, Cristopher. The Complete Plays. London: Penguin Books, 1986, pp 465 - 466.
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sábado, 7 de novembro de 2015


                           ACT ONE, SCENE ONE

(...)
KING EDWARD: Well, Mortimer, I'll make thee rue these words.
Beseems it thee to contradict thy king?
Frown'st thou thereat, aspiring Lancaster?
The sword shall plane the furrows of thy browns,
And hew these knees that now are grown so stiff.
I will have Gaveston; and you shall know
what danger 'tis to stand against your king.
GAVESTON (aside) : Well done, Ned!
LANCASTER: My lord, why do you thus incense your peers,
That naturally would love and honour you,
But for that base and obscure Gaveston?
Four earldoms have I, besides Lancaster, -
Derby, Salisbury, Lincoln, Leicester;
These will I sell, to give my soldiers pay,
Ere Gaveston shall stay within the realm,
Therefore, if he be come, expel him straight.
KENT : Barons and earls, your pride hath made me mute
But now, I'll speak, and to the proof, I hope,
I do remember, in my father's days,
Lord Percy of the North, being highly mov'd,
Brav'd Mowberay in presence of the kinf;
(...)
Brother, revenge it! And let these their heads
Preach upon poles, for trespass of their tongues!
WARWICK: O, our heads!
KING EDWARD: Ay, yours! And Therefore I would wish you grant...
(...)
KING EDWARD: I cannot brook these haughty menaces;
Am I a king, and must be over-rul'd?
Brother, display my ensigns in the field;
I'll bandy with the barons and the earls,
And either die, or live with Gaveston.
GAVESTON: I can no longer keep me from my lord.  (come forward).
KING EDWARD: What, Gaveston! Welcome! Kiss not my hand
Embrace me, Gaveston, as I do thee.
Why shouldst thou kneel? Know'st thou not who I am?
Thy friend, thyself, another Gaveston!
Not Hylas was more mourned of Hercules
Than thou hast been of me since thy exile.
GAVESTON: And since I went from hence, no soul in hell
Hath felt more torment than poor Gaveston.
KING EDWARD: I know it. Brother, welcome home my friend.
Now let the tracherous Mortimers conspire,
And that high-minded Earl of Lancaster;
I have my wish, in that I joy thy sight;
(...)
GAVESTON: It shall suffice me to enjoy your love;
Which whiles I have, I think myself as great
As Ceaser riding in the Roman street,
With captive kings at his triumphant car.


  Marlowe, Christopher. The Complete Plays. London: Penguin Books, 1986, pp 438 - 440.
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( Nota - o termo "brother" aparece sempre como grau de parentesco, e nunca referindo um qualquer relacionamento amistoso, já que Eduardo II e Lord Kent eram irmãos).
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sexta-feira, 6 de novembro de 2015


Christopher Marlowe (26/2/1564 - 30/5/1593) representou, juntamente com Shakespeare (-/4/1564 - 23/4/1616) e com Ben Jonson (11/6/1572 -  6/8/1637), o período áureo do teatro isabelino. Marlowe terá mesmo influenciado Shakespeare quer introduzindo o verso branco na estrutura das peças quer pela importância dada às figuras históricas enquanto tema central de várias peças. A sua morte está envolvida num certo mistério, já que Marlowe terá sido assassinado numa briga numa taberna, em 1593, com apenas 29 anos de idade, dando depois o caso origem à tese de que se tratou de um assassinato político devido ao facto de Marlowe ser um agente secreto ao serviço de Francis Walsingham (chefe da rede de espiões de Isabel I). Aliás, a própria vida de Marlowe será também ela marcada pelas célebres "teorias da conspiração", pois autores existem que defendem que a morte de Marlowe não foi devidamente comprovada, pelo que Shakespeare não será mais do que um pseudónimo que o autor teria depois adoptado. Enfim, acabaram surgindo teorias para todos os gostos...
"Eduardo II" tem um lugar importante na produção literária de Marlowe, sobretudo pela forma como ele alia a qualidade da escrita à cuidada narrativa do reinado em causa. A peça inicia-se com o regresso do exílio de Gaveston, o preferido do rei, e com o episódio em que o monarca cumula o amigo com cargos e benesses suscitando assim invejas e ódios de nobres e da própria rainha, Isabel de França. Após várias pressões e intrigas, Gaveston é de novo exilado da Corte, contudo, a rainha e aquele que viria a tornar-se o seu amante - Mortimer - bem como certos nobres decidem fazer regressar (de novo) Gaveston a Londres, onde se tornará mais fácil o seu assassinato. Facto que será concretizado com eficácia. Eduardo II, desesperado com esta perda, consegue executar dois dos assassinos, mas a conjura torna-se incontrolável e o rei acaba encarcerado, assumindo a rainha o poder, embora fortemente condicionada pela influencia de Mortimer. O despotismo de Mortimer e de Isabel de França torna-se insustentável levando mesmo ao assassinato do irmão do rei, Lord Kent, e do próprio Eduardo II barbaramente executado nas masmorras onde se encontrava. Isabel de França coloca no trono o filho que tivera de Eduardo II, um jovem com apenas 15 anos, mas pensando continuar a exercer o poder juntamente com o seu atual amante, todavia os seus planos não resultam: o novo rei, Eduardo III, ao saber do assassinato do pai, manda executar Mortimer e enclausura a mãe numa das suas residências onde esta ficará até à morte. O rigor e o realismo desta peça, o poder de análise de alguns mecanismos comportamentais e sociais, como o poder, a inveja, a ambição, etc. e a estupefacção perante o destino sumamente infeliz de um Eduardo II que decide trocar o reino, a família e a própria vida para poder ter Gaveston a seu lado, tornam esta obra um dos momentos altos da produção literária de Marlowe, bem como de todo o teatro isabelino.
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quinta-feira, 5 de novembro de 2015



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A Fedra de Racine ( aqui a Cena V do Acto II) na encenação de Patrice Chéreau (2003). Na magistral interpretação de Dominique Blanc (Fedra) e de Eric Ruf (Hipólito).

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                                    Acto II, Cena V


FEDRA:

(...)
Mas não, fora antes eu primeira nesse intento:
inspiraria amor logo o meu pensamento.
Sim, eu, Príncipe, sim, eu com útil socorro
a vós do Labirinto ensinaria o forro.
Quantos desvelos meus por vossa formosura!
A amante um fio só não faz sentir segura.
Companheira do risco a que íeis prontamente,
eu mesma quereria andar à vossa frente.
E Fedra ao Labirinto então sendo descida
seria já convosco ou achada ou perdida.

HIPÓLITO:

Deuses!, o que ouço eu? Senhora, heis esquecido
que Teseu é meu pai e que é vosso marido?

FEDRA:

E porque é que julgais que eu perco tal memória?
Senhor? Terei também perdido a minha glória?

HIPÓLITO:

Senhora, perdoai. Confesso, penitente,
que acusei sem razão falas de uma inocente.
À vossa vista em mim vergonha não resiste
e eu vou...

FEDRA:

                   Ah!, tu, cruel, me ouviste e bem ouviste.
O que te disse é mais do que esclarecedor.
Pois bem! Fedra já vês em todo o seu furor.
Amo. E não vás pensar que a amar-te em tal momento
a mim vou aprovar enquanto me inocento.
Nem que do louco amor, veneno da razão,
cobarde e complacente eu nutri poção.
Infortunada sou: vinganças são celestes,
e abomino-me mais que quanto me detestes.
Testemunham-mo o Céu e os Deuses que em meu flanco
põem meu sangue a arder nesse fatal arranco,
os deuses de quem foi só glória e cruel mal
trazer a sedução a um coração mortal.
Na mente agora tu recordes o passado.
Fugir-te pouco foi, cruel, foste expulsado.
(...)
E eu sofri, eu sequei, a arder em fogo e pranto.
Bastava o teu olhar para te convencer
se um momento esse olhar a mim pudesse ver.
(...)
Coração que tanto ama é fraco a projectar!
Ai de mim!, só de ti é que eu pude falar.
Vinga-te a castigar-me um odioso amor.
Digno filho do herói de teus dias autor,
ao universo tira um monstro que é insólito.
Viúva de Teseu ousando amar Hipólito!
Crê-me, esse monstro atroz não pode já fugir.
Eis o meu coração. E o podes atingir.
Impaciente expia assim ofensa tanta
e já para teu braço eu sinto que se adianta.
Fere. Ou se acaso crês o golpe indigno fosse,
se teu ódio me inveja um suplício tão doce,
ou se de um sangue vil a mão te era manchada,
na falha de teu braço empresta-me essa espada.
Dá.

ENONE:

         Que fazeis, Senhora? Ó vós, ó Deuses rectos!
Mas vem gente. Evitai olhares indiscretos.
Vinde, entrai e fugi vergonha assegurada.


  Racine, Jean. Fedra. Lisboa: Bertrand Editora, 2005, pp 85 - 89 (Edição bilingue com tradução de Vasco Graça Moura).
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quarta-feira, 4 de novembro de 2015


Helen Mirren (Fedra) e Dominic Cooper (Hipólito). Antigo Teatro de Epidauro, 2009. A célebre cena V do Acto II da Fedra de Racine. ( Foto de Tristam Kenton).
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A representação pública da peça La ville dont le prince est un enfant foi seguida (e precedida também) de um coro de críticas e opiniões grande parte das quais apontava as analogias da obra com o grande teatro do século XVII, nomeadamente com a Fedra de Racine. O próprio Montherlant escreve no Posfácio do texto: " La Ville est de ces pièces qui, comme les pièces des tragiques grecs ou celles du XVIIe siècle français, s'appuient sur deux psychologies: une psychologie qui est d'époque, et une psychologie qui est de toutes les époques. La seconde fait passer la première." ( in Posface p 189).
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- HENRIET: Est-ce que tu as tenu ta mère au courant?

- SEVRAIS: A moitié.

- HENRIET: Tu me rappelles de Linsbourg quand je lui ai demandé s'il disait tout en confession. Il ma répondu: "Je dis tout, mais pas les détails." Alors, ta mère supporte Souplier?

- SEVRAIS: Elle le suporte pour que je la supporte.

- HENRIET: Je pige pas.

- SEVRAIS: Je ne pouvais m'empêcher de prononcer le nom de Souplier, c'était plus fort que moi, et comme je rougissais en le prononçant, elle s'est mise à me picoter. D'ailleurs avec gentillesse, de sorte que je me suis découvert un peu. Un jour elle s'est écriée qu'elle savait tout. Elle voulait me faire voir qu'elle est fine, mais elle me faisait voir qu'elle n'est pas fine, car tout de suite je me suis refermé, et ce n'était pas ce qu'elle voulait. Elle a fouillé dans mon cartonnier, en forçant la serrure, et na rien trouvé. Moi, tu le devines, toujours de plus en plus fermé. Alors volte-face: elle s'est remise à me parler de lui gentiment, et moi je me suis rouvert. Avant tout, maintenant, ma mére veut garder ma confiance, et que je reste gai et ouvert avec elle. Nous parlons de Souplier presque tous les jours. Elle l'a appelé: "Ton petit copain." Je n'aime pas quand elle l'appelle comme ça. Ma mère n'as pas le ton. C'est difficile, de trouver le ton, quand on est parent. (...) Par lui, elle demeure dans ma vie. Par lui, elle me conserve. Et elle sacrifierait tout à cela. Elle est comme Agrippine avec Néron.

- HENRIET: Et du même coup, elle te rapproche de lui. Ça, c'est costaud.

- SEVRAIS: Une mère, c'est la langue d'Ésope: le meilleur et le pire. Mais, cette fois, je voulais être en paix avec tous, autant qu'avec moi-même (...).


  Montherlant, Henry de. La ville dont le prince est un enfant. Paris: Folio/ Gallimard, 1997, pp 75 - 76.
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terça-feira, 3 de novembro de 2015


                                         Acte I, scène III

- L'ABBÉ, souriant : Décidément, je vois que l'histoire nous en veut et ne nous lâchera pas! (Temps.) Je ne voudrais pas que vous continuiez de dissimuler, comme vous seriez peut-être tenté de le faire. Il y a aussi de la loyauté en vous: votre présence ici le prouve. Dans ces conditions (souriant), l'alliance serait peut-être plus heureuse que la guerre. Des circonstances se présentent quelquefois où nous devons accepter de bon coeur le risque d'être trompés; je veux dire: où cela est préférable à donner l'impression que nous avons l'obsession du mal. Il n'est pas impossible que je mise sur votre loyauté. In n'est pas impossible que je vous permette de continuer à voir Souplier, mais avec votre promesse solennelle - encore une! c'était bien la peine! - avec votre promesse solennelle que vos relations seront irréprochables.

- SEVRAIS : Monsieur l'abbé, je vous donne cette promesse solennelle!

- L'ABBÉ : Je crois, je crois infiniment au pouvoir de l'affection vraie. Je crois que l'affection vraie est le plus puissant levier qui existe sur la terre. Le bon Dieu nous fait une grâce en nous accordant d'aimer quelqu'un - Ce petit Souplier, ah, qu'il y aurait à faire en lui! (...).


Montherlant, Henry de. La ville dont le prince est un enfant. Paris: Folio/ Gallimard, 1997, p 45.


( A publicação é de 1997, mas seguiu a edição de 1967).
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segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Henry de Montherlant conseguiu, com algum sucesso, fintar os seus biógrafos quanto a muitos aspectos da sua vida pessoal, nomeadamente a sua proveniência social e a sua vida afetivo-sexual. Parece que até a sua data de nascimento alterou de um ano, para assim a conjugar com um acontecimento para ele importante. Considerado um dos grandes escritores do século XX francês, Montherlant foi eleito para a Academia Francesa em 1960 sem sequer tal ter solicitado. A peça La ville dont le prince est un enfant (1951), bem como o texto Les Garçons (1961) baseiam-se na sua expulsão do prestigiado Colégio Sainte-Croix. Relativamente à primeira obra - sobretudo por causa do tema ( o relacionamento entre dois rapazes num colégio religioso e, por sua vez, de ambos com um dos padres) - Montherlant faz acompanhar a publicação do livro de inúmeras opiniões e críticas em forma de Posfácio, mesmo assim, talvez influenciado por uma carta do  então Arcebispo de Paris, onde se louvava a qualidade da obra mas se pedia para que ela não passasse do livro, o escritor proibiu a sua representação em público durante anos e anos. Após os anos 60, com a alteração das mentalidades, La ville... seria então representada em várias cidades e sempre com um êxito enorme, posteriormente seria também adaptada ao cinema. Montherlant, depois de um acidente que quase o cegou, acabaria por se suicidar em 21 de setembro de 1974.
     Seguem-se dois excertos da peça La ville dont le prince est un enfant!  
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