sábado, 10 de maio de 2014

 
 
Sabia também que o mundo natural acolheria bem os resíduos nucleares como um perfeito guardião contra os especuladores ambiciosos, e que qualquer que fosse o ligeiro prejuízo que eles pudessem representar seria um preço pequeno a pagar. Uma das coisas espantosas dos lugares fortemente contaminados pelos núcleos radioactivos é a riqueza da vida selvagem desses lugares. Isto é verdade para os terrenos à volta de Chernobyl, para os locais de ensaios de bombas no Pacífico e para as áreas perto das instalações de armas nucleares da Segunda Guerra Mundial, no rio Savannah, nos Estados Unidos. As plantas e os animais selvagens não se aperceberam de que a radiação fosse perigosa, e qualquer ligeira redução do tempo de vida que possa ter causado é muito menos arriscada do que a presença de pessoas e dos seus animais domésticos. É fácil esquecer que presentemente somos tão numerosos, que quase tudo o que se faça a mais em termos de agricultura, floresta e construção de casas é prejudicial à vida selvagem e a  Gaia. A preferência da vida selvagem pelos locais de resíduos nucleares sugere que os melhores locais para a sua deposição são as florestas tropicais e outros habitats que necessitem de um guardião de confiança contra a sua destruição por ávidos agricultores e produtores.
    Uma vantagem notável do nuclear sobre a energia de combustíveis fósseis é a facilidade em lidar com os resíduos que produz. A queima de combustíveis fósseis produz vinte e sete mil milhões de toneladas de dióxido de carbono por ano (...). A mesma quantidade de energia produzida a partir de reacções de fissão nuclear daria origem a resíduos dois milhões de vezes menores e ocupariam dezasseis metros cúbicos. O resíduo de dióxido de carbono é invisível, mas tão mortal que se as suas emissões não forem detectadas matarão quase toda a gente. Os resíduos nucleares enterrados em poços nos locais de produção não constituem qualquer ameaça para Gaia e só são perigosos para aqueles que imprudentemente se expõem às suas radiações. (...) Acho triste, mas demasiado humano, que haja inúmeras burocracias preocupadas com os resíduos nucleares, organizações complexas dedicadas a desactivar as centrais nucleares, mas nada que se compare a lidar com esse resíduo maligno que é o dióxido de carbono.
 
 
  Lovelock, James. A Vingança de Gaia. Lisboa: Gradiva, 2007, pp 134 - 135.
.
.