quinta-feira, 30 de abril de 2015





     " Anjo-Atlante "  (1)


São dois, os anjos.
Que peso suportam os ombros?
Vestidos de flor de roseira
no bater do coração, à espera de folgar


próximos, logo distantes.
De madrugada, quando a lua se esconde e
o músculo das espáduas se derreia
os dois, a par


que eram moços, que noivavam, que
iam por abismos num sem querer


um anjo em outro se desdobra
num jeito rapaz de querer passar à frente
de transparência em transparência
vivos, impuros




(1)  Calcário policromado. Mestre Pero. Séc. XIV




     Jorge, João Miguel Fernandes. Mirleos. Lisboa: Relógio D'Água, 2015, p 22.
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quarta-feira, 29 de abril de 2015



V.
  
   Hoje é o dia das catástrofes assumidas. Do infortúnio a germinar como árvore de frutos nodosos e secos. É o negro dia dos sem remédio, de todos quantos se arrastam sem caminho nem valimento e que depois, ávidos de fim, se encostam às paredes mais obscuras na gorada espera de qualquer passagem. É o tempo das escritas sem entranhas, do tropel das imagens a encavalitarem-se umas nas outras na encenação de um dentro que nunca tiveram, para que seus parlamentares e escribas, de camisa preta e facho na mão, possam finalmente imitar as marchas de 39 pelas ruas de Roma. Hoje é o dia das catástrofes assumidas, das fronteiras delimitadas com um giz preto feito com as cinzas de Birkenau, para que o topo seja mais topo na ilusão de um chapéu de três bicos, de um azorrague bem untado ou de uma fileira de prateleiras e tronos para o assentamento dos camisas pretas na sua pose de casacos coçados e com o dedo grande dos pés a escapar-se dos sapatos cambados e sem protetores. Hoje é o dia dos que espreitam prontos a avançar e daqueles que avançam, mas, sem espreitar, lhes vão assim abrindo o caminho. Este é o dia em que não entro, o dia de uma negritude que recuso, enquanto os olhos me fogem pelo tampo branco da mesa na invenção de um outro tempo resplandecente e de uma outra qualquer cidade que não me tenha por vendilhão nem cúmplice.

   Mateus, Victor Oliveira. Negro Marfim. Fafe: Editora Labirinto, 2015, p 16 ( Prefácio: Miguel Real;  Inventário de Inquietações: Texto de Ronaldo Cagiano).
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terça-feira, 28 de abril de 2015







XXVII

   O homem veio afinal com sua indumentária preta. Veio lá dos lados da Foz, que mais pormenores não tínhamos nem queríamos. Encontrou-se connosco na esplanada onde a velha me seduzia c’um seu carago. O homem faria inveja a Cervantes – sussurraste-me -, pela sua viseira igualmente preta, sua BMW K1600 GT, seus moinhos de vento mesmo ali na Rotunda da Boa Vista. O homem saltou da mota e a velha, qual Dulcineia finalmente rendida, disse outra vez c’um carago. O homem entregou-nos a chave (a chave ou o elmo de oiro de Mambrino?) e apontou-nos o apartamento, lá para trás da Casa da Música. Sentimos no ar qualquer coisa de tráfico, de obsceno. Pediste-lhe o recibo, mas ele disse que depois, que depois porque Rocinante estava mal estacionado. Mercado negro!, concluíste, mas eu já não ouvia resmungos, tão à parte me sentia: Cavaleiro dos Espelhos, com escudeiro tão fiel, não é coisa normal em tempos sem branco nem lei.

  Mateus, Victor Oliveira. Negro Marfim. Fafe: Editora Labirinto, 2015, p 42 (Prefácio: Miguel Real;  Inventario de Inquietações: Texto de Ronaldo Cagiano).
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domingo, 26 de abril de 2015

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Nota - O poema Vittoria (1964), de que se apresenta aqui um excerto, integra o livro "Poesia in forma di rosa". É um texto que evoca, ainda que de forma onírica, um tempo que se pensava já ultrapassado: o tempo da guerra de guerrilha e da revolução que, outrora, parecera tão próxima, mas que acabara abortando. Apesar do carácter invetivador deste poema, ele acena com uma lucidez desesperada  e com uma inaudita capacidade profética, mas também com um misto de angústia e desencanto, toda a crise que mais tarde se abateria sobre a península italiana.
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      "  Victoire  "

(...)
qui, hélas, auront eu raison - je rêve d'armes
enfouies dans la boue, dans la boue élégiaque,
là où des enfants jouent, et de vieux pères bêchent,

tandis que des dalles tombe la mélancolie,
les listes de noms se fendent,
les couvercles des tombes volente en éclats,

et de jeunes cadavres, portant le paletot
que l'on portait ces années-là, des pantalons
flottants, et, sur leur chevelure partisane, le calot

militaire, dévalent des murailles
où se tiennent les marchés, par les sentiers
qui relient les premiers vergers aux escarpements

des collines: ils descendent des cimetières. Des jeunes gens
avec dans leurs yeux quelque chose d'autre que l'amour:
une folie secrète, celle d'hommes qui luttent

comme appelés par un destin différent du leur.
Avec ce secret qui n'est plus un secret,
ils descendent, muets, dans le soleil levant,

(...)
Ils reviennent, et nul ne les arrête. Ils ne cachent pas

leurs armes - qu'ils étreignent, sans douleur et sans joie -
et tous baissent les yeux, comme aveuglés par la pudeur,
devant l'obscène éclat de ces mitraillettes, et ce pas de vautours

qui descendent vers leur obscur devoir, au grand soleil.


    Pasolini, Pier Paolo. Poésies 1953 - 1964. Paris: Gallimard, 2014, pp 271 - 273 (Traduction de José Guidi).
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quinta-feira, 23 de abril de 2015


Nota- O poema “A un Papa”, de que segue aqui um excerto, é um ataque violento do Cristianismo de Pasolini ao Cristianismo do polémico Pio XII. O texto integra o livro “La Religione del mio tempo”, dedicado a Elsa Morante.

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....    ...   ...    ...    ...    ...    ...

um montão de construções miseráveis, pocilgas e não casas,

   bastava apenas um gesto teu, uma palavra,

para que aqueles teus filhos tivessem uma casa:

   tu não fizeste um único gesto, não disseste uma só palavra.

Nem sequer precisavas de pedir que se absolvesse Marx! Uma vaga

   imensa que se abatia sobre milenares modos de vida

separava-te dele, da sua religião:

   e na tua religião não se fala já de piedade?

Milhares de homens, sob o teu pontificado,

   mesmo frente aos teus olhos, viveram entre imundície e pocilgas.

Tu sabia-lo, pecar não significa fazer o mal:

   recusar fazer o bem, isso é que é pecar.

Ah, quanto bem tu poderias ter feito! E, no entanto, não o fizeste:

   jamais houve pecador tão grande como tu.

 

 

 

 Pasolini, Pier Paolo. Poésies 1953 – 1964 . Paris: Gallimard, 2014, p 174 (Tradução minha a partir do italiano).

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Nota - O longo poema La Religione del mio tempo integra o livro com o mesmo título publicado em 1961 e é contemporâneo dos filmes Mamma Roma (1962), com uma estrondosa interpretação de Anna Magnani, e La Ricotta (1963). La Religione del mio tempo é um livro fundamental para se perceber a tentativa feita por Pasolini para elaborar uma grande síntese entre Cristianismo e Marxismo. É desse poema que se apresentam aqui uns excertos:
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    " La Religion de notre temps "

(...)
accrocher un soupçon; dans les cafés, le jour,
la nuit, dans les salons; mais en vain chacun cherche
à déchiffrer sur les traits d'autrui le retour

de l'antique espérance: et s'il y reconnaît
quelque espoir, ce ne peut être qu'un espoir inavouable,
dans le jeu de l'offre et de la demande,

et les regards paraissent n`être que le spasme
d'une blessure interne; qui nous laisse exsangues,
inactifs, mécontents, qui pousse à une grève

des sentiments, à une stagnation coupable
de la conscience, à une paix malsaine,
qui ne nous livre que des jours gris et tragiques.

Ainsi, si je scrute le fond de l'âme
de ces groupes d'hommes qui vivente
ce temps, le mien, qui me sont proches ou voisins,

Je vois que sur les mille sacrilèges possibles
qu'il appartient à toute religion naturelle
de dénombrer, il en est un que l'on retrouve

toujours, partout, et c'est la lâcheté.
Un sentiment éternel - une forme
de sentiment - pétrifié, immuable,

qui inscrit en tout autre sentiment,
directement ou indirectement, sa trace.
C'est cette lâcheté qui fait de l'homme un incroyant.

C'est une sorte de profond empêchement
qui ôte toute force au coeur de l'homme,
toute chaleur à son raisonnement,
(...)

Là, parmi ces maisons, ces places, ces rues pleines
de veulerie, en cette ville où règne en maître
désormais cet esprit nouveau qui fait offense

à l'âme à tout instant - avec les cathédrales,
les églises, les monuments muets dans l'angoissante
désuétude où les laissent les hommes

qui ne croient plus - je me refuse
à vivre désormais. Il ne reste plus rien,
...   ...    ...     ...    ...   ...    ...   ....    ...


   Pasolini, Pier Paolo. Poésies 1953 - 1964. Paris: Gallimard, 2014, pp 151 - 155 (Traduction de José Guidi).
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quarta-feira, 15 de abril de 2015

Prémio Literário Glória de Sant'Anna 2015



Obras finalistas:


Debaixo do Silêncio que Arde de Mbate Pedro (Moçambique) , Ed. Índico.


Da Vida Conclusa de Mário Herrero Valeiro (Galiza), O Figurante Edicións.




Júri :


Fátima Mendonça (Professora de Literatura/ Universidade Eduardo Mondlane)


Jacinto Guimarães (Colaborador do jornal de Válega)


Rui Paes (Pintor)


Victor Oliveira Mateus


Xosé Lois García (Escritor)
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Nota - O longo poema Le Ceneri di Gramsci , escrito em1954, integra um dos primeiros poemários de Pasolini que adota o título desse mesmo poema. Reproduz-se aqui um excerto desse texto  numa  tradução de José Guidi, tradução que o próprio autor supervisionou.


                      VI

Je m'en vais, je te quitte, dans le soir,
qui, malgré sa tristesse, tombe si doux,
pour nous, vivants, dans la clarté cendrée

qui se raccroche au quartier dans la pénombre.
Et le travaille. Le grandit, en évide
les alentours, et, plus loin, le rallume

d'une vie furieuse, où le rauque
roulement des tramways, les cris humains,
dialectaux, forment un concert trouble

et absolu. Et on sent bien que pour ces êtres
vivants, au loin, qui crient, qui rient,
dans leurs véhicules, dans leurs mornes

ilôts de maisons où s'évanouit
le don perfide et expansif de l'existence -
cette vie n'est qu'un frisson;

présence charnelle, collective;
on sent l'absence de toute religion
véridique; non point vie, mais survie

- plus joyeuse, peut-être, que la vie - comme
en un peuple d'animaux, dont le secret
orgasme ignore toute autre passion

que celle du labeur de chaque jour:
humble ferveur, que vient parer d'un air de fête
l'humble corruption. Plus se fait vain

-en cette trêve de l'histoire, en cette
bruyante pause où la vie fait silence -

(...)

et le terreau des Abattoirs, il s'y imprègne
d'un sang fétide, et que partout
il remue détritus et odeur de misère.

La vie est bruissement, et ces gens qui
s'y perdent, la perdent sans nul regret,
puisqu'elle emplit leur coeur: on les voit qui

jouissent, en leur misère, du soir: et, puissant,
chez ces faibles, pour eux, le mythe
se recrée... Mais moi, avec le coeur conscient

de celui qui ne peut vivre que dans l'histoire,
pourrai-je désormais oeuvrer de passion pure,
puisque je sais que notre histoire est finie?


  Pasolini, Pier Paolo. Poésies 1953 - 1964. Paris: Gallimard, 2014, pp 37 - 43 ( Traduction de José Guidi).
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domingo, 12 de abril de 2015

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Judith Malina (4/6/1026 - 10/4/2015) : poeta, atriz, diretora de teatro, J.M., apesar de nascida na Alemanha, tornou-se uma figura importante da cultura norte americana, ligada que esteve sempre aos ideais anarquistas e da não-violência.
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AMOR Y POLÍTICA
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cuando navegaba por la isla Ciprus
en bote
vi emerger del agua
la cabeza de Afrodita
le dije: "soy anarquista
y no voto"
me contestó: "me parece bien".


le dije: "¡oh! invención de
la mente clásica
¡eres ciega
frente a temas importantes!
ella asintió
por no ser descortés
y me dijo: "hasta luego"
"quédate" le pedí
"hay muchas cosas
que deberíamos conversar:
el poder de reyes
innecesarios,
la opresión sexual
de la que habla Safo…"
pero ella sólo
se sumergió
de vuelta en el mar.




       Judith Malina


 



sábado, 11 de abril de 2015

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        "  Nostalgia  "

Não sei ha quanto tempo escureceu...
Adormece... Eu ando tão cansada!...
Resava quando o sono me venceu -
Meu Deus!... Já vem rompendo a madrugada!

Que estranha somnolencia que me deu!...
Olho atravez dos vidros - a geada,
parece o mostruario dum hebreu... -
refulgem pedrarias na ramada!

O Sol, fonte doirada e faiscante
incendiou os vidros da janela
e irradia na relva verdejante...

- Mas a luz da minha alma não voltou...
Perdi-a, e nunca mais eu soube dela
desde o dia em que a tua m'a levou!


  Teixeira, Judith. Castelo de Sombras. Lisboa: Imp. Libanio da Silva, 1923, pp 49 - 50.
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Nota - o post segue fielmente a ortografia e a sintaxe do original.
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sexta-feira, 10 de abril de 2015

Nota - os poemas de Judith Teixeira seguem a grafia da época.




            "  Duma Carta  "


Escrevi-te hontem
somente para dizer
das minhas maguas e do meu amor...
O sol morria...
Tudo éra sombra em redor
e eu..., ainda escrevia...


A pena sempre a correr
sobre o papel,
deixava sintilações,
nas pedras do meu anel!


E a pena corria...
Nem precisava ver, o que escrevia!...


Anoitecêra.
...............................
Como em toalha de altar
a mesa
revestiu-se de luar!...


Nascêra a lua.
E a pena, nos bicos leves,
dizia ainda:
- Sou tua!
Por que é que me não escreves?
mas o papel acabou,
e a pena continuou:
Por que é que me não escreves?
O meu amor é todo teu
Só eu te sei amar!
- Só eu!...




    Teixeira, Judith. Castelo de Sombras. Lisboa: Imp. Libanio da Silva, 1923, pp 13 - 14.
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quinta-feira, 9 de abril de 2015

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                 "  das almas...  "

                  
                                      para Victor Oliveira Mateus


os poetas não dormem
olham para o mundo da noite
sonham ver a sombra do destino
os poetas morrem novos porque não dormem à noite
também há os que morrem muito velhos
para vigiarem todas as noites
que o mundo lhes entregou
de todas ainda sobram muitas...

os poetas cansados à noite choram
pelos que nascem na madrugada
oram em palavras escondidas
quando o espírito parece adormecer...

os poetas não sabem escrever
imploram o afastamento da dor
abandonados de tranquilidade
tentam resistir à agonia...

os poetas não são seres
são gente que se move nos astros
moribundos que pedem sono
almas acordadas que esperam
beijos de amor...

os poetas são folhas pequeninas
que tombam na manhã...
caem para a terra fecundar
num gesto que permanece
nos passos silenciosos dos outros
(folhas imensas que não tombam)

os poetas não sabem ler
soletram e as letras formam palavras
solidificadas que rasgam os corações
daqueles que não dormem à noite...

os poetas cansam as palavras
também elas não dormem à noite
permanecendo intrigadas
à espera que os poetas adormeçam
nos sonhos dos beijos por chegar


  Levy, Henrique. O Silêncio das Almas. Macau: CriarInovar, 2015, pp 37 - 38.
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   "  limite  "




encontrei figos desertos
flores por nascer
agora do promontório
vou desvanecer
atirar-me ao mundo
vermelho sangue
senhor a minha alma
é igual à alma
das ilhas


ambas têm por noivo
a malva a areia o trevo
deslizando na várzea
do corpo reinventado
em glórias e medo




   Levy, Henrique. O Silêncio das Almas. Macau: CriarInovar, 2015, p 34.
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quarta-feira, 8 de abril de 2015

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                         " Proposta 1: Chairman "

veste o fato purulento ajeita o que resta de si. senta-se sobre isso mesmo.
sacode-se

chairman' cadeira-homem-cadeira' pés de balsa' memórias de resina'
gestos vermelhos a estofar os dias' raízes a ramificar em braços'
chairman' uma arquitectura de nódulos e contranódulos a tricotar as
estruturas do-que-temos com o azul.

não sabe onde está a filha que emigrou para el-dorado-de-cima

a filha uma grande cabeça de azulejo alicatado

a filha que levou o anel da mulher' que deus a tenha' o anel da mulher'
que levou cinco sessões de cinema a ser sua e ele a ser dela' quando o
amor era uma grande cidade à noite' quando o cinematógrafo falava
aos domingos mais que alto que o trabalho e os canos constipados e
as dívidas na mercearia do sr. josé' que aviava a fruta e os legumes à
pequena das tranças' que cresceu até ser um-par-de-mamas e uma
possibilidade biológica de gestação em saltos altos' tão altos que não
chegam a chairman' mas ela tem uma grande utopia guardada na
carteira' juntamente com as senhas do bus : aprender inglês emigrar e
deixar para trás todos os outros soldados da nação-zinha

mas levará o anel da mulher do homem que tem um grande sonho
na vida que é ser cadeira que tem um grande sonho na vida que é ser
homem

ok?



    Grácio, Rita. Cintilações da Sombra III, Antologia de Poesia. Fafe: Editora Labirinto, 2015, p 65 (Coordenação de Victor Oliveira Mateus).
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terça-feira, 7 de abril de 2015

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                 " Disco 2000 "


Se da corrida nos sobrarem os anos
e na volta o teu tempo do meu se despeça
teremos para sempre ficado
para sempre dois nomes a gostar juntos

Sabes a temporada tem mudado
do grupo de atletismo a maravilha já passou
mas só aqui eu Setembro começo e no ano confio
é uma força razoável por árvores contada

E era sopro talvez correndo to tenha dito
e agora me animem assim agitadas
as coisas que contigo começava a recordar
para uma fundista caligrafia



Machado, Hugo Milhanas. Cintilações da Sombra III, Antologia de Poesia. Fafe: Editora Labirinto, 2015, p 32 (Coordenação de Victor Oliveira Mateus).
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segunda-feira, 6 de abril de 2015

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   "  La vida según Bacon "


Soy el hombre que Bacon ha pintado
- más guapo, menos viejo -
desnudo sobre un váter parisino.
Soy el mismo animal en cuyos ojos
el sexo y el terror supuran una
violencia que no encuentra analogía.
Asmático de sangre, soy adicto
a los golpes de sangre,
y en pos de la belleza he destrozado
la jaula de la vida desguazando
con ella el animal que la habitaba.
No importa:
                   la escena es algo hermoso
como es hermosa la violencia
en los cuadros de Bacon.

Porque somos el monstruo de esos cuadros
y estamos infectados de un destino
repugnante y sublime.

Llevamos cada uno en nuestra sangre
la hora de la muerte.
                                 Nada impide
preñar de nuestra muerte cuerpos nuevos.
Los monstruos se perpetuan en el sémen.
Sus hijos tienen dientes en los ojos
y devoran el mundo exactamente
igual que nuestros padres devoraron
el mundo com sus ojos y sus dientes.

Nustro cuerpo es la hostia
sobre la que culmina el sacrifício
que quisimos amor y amor no pudo.
Lo supo Bacon bien; al fin y al cabo
lo dije el hijoputa mientras brinda
en un documental de los ochenta:
el amor es ser bueno. Pero estaba borracho.


Segura, Antonio Praena. Cintilações da Sombra III, Antologia de Poesia. Fafe: Editora Labirinto, 2015, pp 15 - 16 (Coordenação de Victor Oliveira Mateus).
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