segunda-feira, 28 de abril de 2014


 
(...) interrogava-me sobre  o que poderia manter a nossa quimicamente instável atmosfera num estado dinâmico constante e a Terra, aparentemente, sempre habitável. Além disso, a continuidade da vida requer um clima tolerável, apesar de um aumento de trinta por cento da luminosidade solar desde a formação da terra. No seu conjunto, estas reflexões conduziram-me à hipótese de os organismos vivos regularem o clima e a química da atmosfera no seu próprio interesse; e em 1969 o romancista William Golding propôs chamar-lhe Gaia. Poucos anos mais tarde principiei a colaborar com a notável bióloga americana Lynn Margulis, e no nosso primeiro artigo conjunto afirmámos: a hipótese Gaia encara a biosfera como um sistema de controlo activo e adaptável, capaz de manter a Terra em homeostasia.
   Desde o seu princípio, nos anos 60, a ideia de auto-regulação global do clima e da química era impopular para ambos, quer para os cientistas da Terra, quer para os cientistas da vida. Na melhor das hipóteses, achavam-na desnecessária como explicação dos factos da vida e da Terra; na pior, condenavam-na abertamente em termos mordazes. Os únicos cientistas que acolheram bem a ideia foram alguns  meteorologistas e climatologistas. Alguns biólogos recusaram logo a hipótese, argumentando que nunca se teria desenvolvido uma biosfera auto-reguladora, uma vez que a unidade de selecção era o organismo, não a biosfera. Tive a sorte de contar com esse distinto e esclarecido autor Richard Dawkins como defensor da oposição darwiniana a Gaia; foi doloroso, mas, com o tempo, dei comigo a concordar com ele em que a evolução darwiniana, como era entendida, era incompatível com a hipótese de Gaia. Eu não questionava Darwin, portanto, o que é que havia de errado com a hipótese Gaia? (...)
   Para voltar à argumentação com os darwinistas, ocorreu-me em 1981 que Gaia era o sistema completo - juntos, organismos e meio material associado - e foi este imenso sistema terrestre que desenvolveu a auto-regulação e não isoladamente a vida ou a biosfera. Para pôr à prova esta ideia compus um modelo em computador (...). Este modelo, a que chamei "Daisyworld (...). O "Daisyword" é um modelo de um planeta como a Terra, orbitando à volta duma estrela como o nosso Sol. (...) O "Daisyworld" foi inventado para mostrar que a teoria de Darwin da evolução por selecção natural não é contrária à teoria da Gaia, mas sim uma parte dela.
 
 
  Lovelock, James. A Vingança de Gaia. Lisboa: Gradiva, 2007, pp 43 - 45.
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