sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017



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O que me fascina em Tristan Garcia, sobre quem já escrevi algumas linhas neste blogue, é a sua capacidade de traçar pontes e de elaborar sínteses coerentes e inabaláveis, através de um diálogo sistemático não só com a tradição filosófica e literária, mas também com a contemporaneidade.. Acabado de sair o mais recente ensaio deste filósofo, o livro "Nous", sobre o qual haverei de falar aqui mal acabe de o ler, podemos assistir nesta conferência simultâneamente à clarificação desse conceito de "Nous", mas articulando-o ele com as diversas formas de realismo a cujo levantamento o filósofo procede aqui. Começando por explicitar as questões levantadas pelo realismo especulativo, sobretudo o defendido pelo filósofo norte-americano Grahaam Harman, realismo esse que visa desmontar o correlacionismo pós-kantiano e que nos acabará dizendo que o real não precisa de nós , Garcia - nesta conferência - passa a analisar uma outra espécie de realismo - o realismo político, onde enfatiza, num plano historicista, os vários planos do "Nous" exemplificando com a crítica de Castorius a Tucídedes, segundo a ideia de quanto mais o "Nous" se torna abrangente mais ele se fragiliza e aqui é dado o exemplo das cidades gregas, quanto mais eram unidas - em número - numa aliança, mais essa aliança (esse "Nous"!) se fragilizava, de entre as várias correntes do realismo político, Garcia não deixa de acentuar, nesta conferência, uma subdivisão de filósofos de cariz fasciszante (ele diz mesmo aqui: fascistas!). A exposição de Garcia entra, por fim, num terceiro tipo de realismo: aquele que se liga à ficção. Ora, se o realismo especulativo defendia que o real não necessitava de nós e defendia mesmo que as relações que manteríamos com os objetos eram iguais àquelas que esses mesmos objetos teriam entre si, neste terceiro tipo de realismo "ficcional" o homem cria um real que precise dele. E aqui Tristan Garcia cinde a ficção em dois tipos distintos: a) a ficção religiosa e dá como exemplo a filosofia de Feuerbach sobre a religião; b) a ficção artística. À medida que se aproxima do final da conferência; Garcia recorre à linha de raciocínio já utilizada na metodologia do seu último ensaio ( Une vie intense ) de que já se falou neste blogue, sobretudo quando nesse livro defende o conceito de "resistência" como pertinaz mecanismo ético e "equilibrativo" da ação humana. Aqui, agora  no campo da Estética, da ficção romanesca e, concretamente, da sua prática como romancista, ele diz-nos que uma arte puramente centrada no realismo ou outra puramente centrada no imaginário tirariam da sua força a sua derradeira - e completa - derrota, já que se o real se mantém exterior a nós, o homem acaba criando um outro real que precise dele e eis-nos no campo - indestrutível! - da sua concepção de romance e, por generalização através das obras dele por mim  já lidas, dos pilares base da sua filosofia.
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