segunda-feira, 26 de março de 2018



                     Enigma


Sonho novamente com você
e,como sempre,
acordo muito tempo
depois.

Muito tempo depois do que você foi
antes do sonho
e num tempo estranho depois
do sonho.

Sim, porque o sonho era você
e não era,
não propriamente você,
pois quem era não se parecia
com você,
mas punha em mim um sentimento profundo,
como antigamente,
de você.

Uma espécie de enigma que contemplo
e não decifro,
apenas me conformo com ele
de alma toda.
E lá se vai o dia após o sonho...

E lá vou eu pelo que resta da vida...
Que é, como escreveu
um antigo ajudante de guarda-livros
na cidade de Lisboa,
nada além de uma estalagem
onde tenho que me demorar
até que chegue a diligência
do abismo.
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  Filho, Ruy Espinheira. Babilônia & outros poemas. São Paulo: Editora Patuá, 2017, pp 72-73.
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