terça-feira, 6 de dezembro de 2016
" Calipso "
Amava as coisas que eram minhas:
o silêncio desnudado, salpicado de água,
a pedra limpa onde cresciam os deuses
e no fundo dos rios repousava.
Nada o tempo vencia
e nada era maior do que essa brancura.
Caminhava cega pelos vales,
amada pela terra.
Colhia flores nos desertos de sombra,
com todo o fulgor da alegria pousado
em cada gesto.
O voo dos pássaros não tinha princípio nem fim.
Cruzavam o ar
em círculos de neve, procurando a madrugada.
Beijei a claridade como se bebesse a água mais pura
de límpidos mananciais.
E quase te fiz eterno.
Mas não podia adivinhar
o que a mão da noite
andava urdindo
- tão lenta e calada -
por baixo desta luz,
a cada instante:
um eterno adeus de tudo aquilo, que, formoso,
foi meu, mas já ali não estava.
Vilar, Marta López. En las aguas de octubre. Madrid: Bartleby Editores, 2016, pp 41-42 ( Tradução: Victor Oliveira Mateus).
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