(Estes dois excertos ilustram a recensão que segue imediatamente abaixo)
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Racionalmente, desejava ser um rei constitucional, mas o seu temperamento pressionava-o a agir de outro modo.
É por isso que não é simples adjectivar este rei do ponto de vista da divisão entre esquerda e direita. De certa forma, a tentativa nem faz sentido. A vitória dos liberais durante a guerra civil de 1832.1834 levara a que o centro da vida política se deslocasse para a esquerda. Como notaram os estrangeiros que visitaram Portugal, aqui toda a gente parecia "progressista". Agarrada ao Trono e ao Altar a direita suicidara-se. Educado por pais liberais, D. Pedro era, e queria-se, um monarca exemplar. Nunca quis ouvir falar das desgraças do tio-avô D. Miguel, muito menos dos exilados que o tinham acompanhado. Desprezava as velhas famílias, que considerava caquéticas. Odiava os antigos rituais monárquicos. A boçalidade das classes médias enervava-o. Sofria com a miséria popular entrevista durante as viagens que fizera pelo país. Mas não tolerava limites ao seu poder.
(...) Por outro lado, nunca defendeu que o ensino primário devesse ser entregue a padres, classe, aliás, que considerava demasiado ignorante para merecer respeito. A sua ambição era montar uma vasta rede de escolas primárias, o primeiro passo, na sua opinião, para o desenvolvimento económico do país. Finalmente, queria que Portugal fosse atravessado de comboios, que o porto de Lisboa se transformasse no mais bem apetrechado da Península Ibérica e que as estradas passassem a ser vias decentes, tudo coisas que permitiram ligar o país ao resto da Europa.
Além da modernização económica, interessava-o o aperfeiçoamento do sistema representativo. (...) Os actos eleitorais ocorridos em Portugal deixavam-no prostrado. A realidade caciqueira impunha-se, feroz, contra a sua vontade. Apesar de tudo, em 1859, conseguiu impor a promulgação de uma boa lei eleitoral. Mas o seu feitio não era de molde a tirar prazer de pequenas reformas. Até morrer, continuou insatisfeito: com os governantes, com os súbditos e, acima de tudo, consigo mesmo.
Mónica, Maria Filomena. D. Pedro V. Lisboa: Círculo de Leitores, 2005, pp 205-206.
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