"Destino"
Não tive a má intenção de te prender
à minha vida. A música, o álcool,
todo o ouropel da noite, eu só quis
sossegar por algum tempo a dúvida
que me castigava, antes que a manhã
chegasse e a aranha do remorso
descesse pelo seu alimento à mesa
do pequeno-almoço. Batemos
à mesma porta e chamaste destino
ao acaso. Zelava por nós, entre
as eléctricas estrelas, o pequeno deus
do amor? Era o que trazia ao peito
a divisa da derrota universal? Como vês,
foi sempre outra, e inútil, a minha
fé - mas perdoa, se puderes, o pouco
que soube fazer pela solidão dos dois.
Cabral, Rui Pires. Morada. Porto: Assírio & Alvim, 2015, p 212.
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