sábado, 4 de março de 2017
"Escrito num Livro de Horas"
Enquanto nas cidades costeiras
o coro trágico da posteridade
aspira o ar
como funcionário que se prepara
para as tarefas do dia
avisto os teus olhos
Os teus olhos deveriam ter nascido em épocas diferentes
em mundos diferentes
não neste lugar panorâmico e incurável
onde os sentidos são
repetidamente censurados
nestes barrancos áridos
para que o tempo passe
com todas as armas da culpa
No salva-vidas enquanto o meu navio se afunda
os teus olhos
dos quais nunca me poderia defender
erguem-se num louvor
capaz de ensurdecer para sempre
os que duvidam
Mendonça, José Tolentino. Estação Central. Porto: Assírio & Alvim, 2015, pp 32-33.
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